ARTIGO – DEZ ANOS DE UM CONCLAVE QUE MUDOU MINHA HISTÓRIA COM O JORNALISMO

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Foto: Getty Imagens

DEZ ANOS DE UM CONCLAVE QUE MUDOU MINHA HISTÓRIA COM O JORNALISMO

Há uma década, a eleição do Papa Francisco marcou vida profissional

Jonathan Silva*

A eleição do Papa Francisco foi marcante para o mundo todo. Recheada de simbolismos e de ineditismo, aquele conclave que elegeu o cardeal argentino Jorge Mario Bergoglio completa, neste 13 de março, 10 anos. Uma década desde que a Praça de São Pedro — e o mundo — assistiram aquela chaminé da Capela Sistina ostentar uma fumaça branca. A euforia da escolha foi completada com a surpresa do primeiro pontífice latino-americano. O primeiro jesuíta, também. Mas se aquela eleição marcou o mundo, comigo e com a minha vida profissional não foi diferente.

Antes de tudo, preciso relembrar o dia da renúncia do Papa Bento XVI. Na época, eu trabalhava na Câmara de Vereadores de Pelotas e já faziam dois anos que eu participava do Pelotas 13 Horas. Estar ao lado de tantas referências da comunicação e aprender, diariamente, com o Clayton Rocha, me trazia uma satisfação enorme, ainda mais pra quem ainda cursava a faculdade de jornalismo.

Mas retomando aquele 11 de fevereiro de 2013, eu mal havia chegado no legislativo pelotense e, como hábito que me acompanha até hoje, logo fui devorar jornais atrás de notícias. De cara, uma me congelou: o papa anunciou, em reunião fechada, que iria reuninciar ao Trono de Pedro ainda naquele mês. Uma renúncia de papa hoje pode parecer familiar, na época era algo inacreditável, inimaginável.

Lembro que na hora peguei o telefone e liguei pro Clayton, afinal, quem é mais ligado a coberturas vaticanas do que ele?. Enquanto o telefone tocava — e logo na sequência que ele atendeu — eu ja ia pesquisando e buscando informações sobre tudo aquilo que envolvia aquele ato. Já teve algum papa que renunciou? Quando e quem foi? E agora, o que acontecerá com Bento XVI? Quando será o próximo conclave? Aliás, como funciona um conclave? Quem é favorito? Tem algum brasileiro ali?

Enfim, foram inúmeras inquietudes que me acompanharam por mais de um mês. Durante esses mais de trinta dias, eu revirei a história dos conclaves, da política na igreja, entendi como funciona as votações, quem pode votar e quem pode ser votado, fiz uma lista de todos os cardeais presentes, acompanhei por horas vários noticiários atrás de informações, entendi o ritual todo desse processo eleitoral e passei, por horas, ligado na tv acompanhando as transmissões que envolviam aquilo tudo. Tudo isso com um claro propósito: eu queria estar pronto pra ajudar o 13 horas nessa cobertura. Clayton iria para Roma e eu sabia que, de Pelotas, precisaria contribuir para que o programa mantivesse viva aquela que é uma marca dele: as coberturas da eleição do líder da Igreja Católica.

E assim foi. Por dias, com a presença do Clayton no estúdio, fui acompanhando, observando e tentando extrair ao máximo as nuances de uma cobertura como aquela.

Quando Clayton embarcou pra Roma, eu intensifiquei minhas pesquisas e minha atenção diária aquilo que acontecia na Itália. Nisso, não eram raros os comentários de que um italiano voltaria a ocupar o posto. Até um brasileiro estava entre os cotados. Eram tantos elementos que fervilhavam a minha cabeça e me faziam contar os minutos para estar no estúdio do 13, ali no Palácio do Comércio, no coração de Pelotas.

Só que pra me deixar ainda mais tenso, não raros — e é uma característica do programa — as transmissões começavam com poucas pessoas no estúdio, o que logo mudava de cenário com presenças marcantes e debates calorosos. Só que além daquela responsabilidade de participar, ainda que de Pelotas, daquela cobertura, o Clayton resolveu ter a companhia de duas pessoas que também me inspiravam: Pablo Rodrigues, editor-chefe do Diário Popular, na época, e Sérgio Cabral.

Era um trio impressionante pela capacidade de combinarem, cada um na sua característica, uma cobertura grandiosa. O cara que me ensinou quase tudo que sei de jornalismo, experiente e referência em cobertura papal, o chefe do principal jornal da cidade, e uma das maiores referências da comunicação pelotense. Para um guri que estava engatinhando no jornalismo era motivo de frio na barriga e de ampliar, ainda mais, as pesquisas, os estudos, as horas frente ao televisor.

Mas adiantando o passo, até pra não se tornar um conclave esse texto, recordo-me do dia em que Francisco foi eleito. O saudoso Cabral ousou falar no rádio que poderia ser um papa argentino provocando a ira do Clayton. Era inimaginável. Essa história é engraçada e memorável, mas merece ser contada pelo próprio Clayton. Era noite em Roma, chovia. Era começo de tarde no Brasil, não me recordo do clima.

O olhar grudado na tevê me indicava que algo de histórico estava por acontecer. Diversas votações já tinham ficado pra trás e estava cada vez mais próximo a eleição de um novo pontífice. Me lembro que, quando aquela fumaça branca saiu da chaminé, eu deveria ter uma dez abas abertas no meu computador. Trocava de canal atrás de alguma informação, alguma pista de quem era o escolhido, enquanto eu literalmente despejava milhares de informações no meu facebook com curiosidades sobre a eleição e os passos que estavam acontecendo. Escrevia com tanta confiança e propriedade, que parecia que eu era um expert no tema. Mas anos depois, com a experiência chegando de verdade, eu pude perceber que de fato eu tinha aquela confiança e ousadia fruto do papel daqueles três em Roma.

Quando o anúncio do papa chegou e Bergoglio apareceu na janela da Basílica, minhas mãos não acompanhavam mais a velocidade que meu raciocínio fervilhava com a vontade de transmitir todas aquelas informações que, por dias, eu colhi e preparei. Muitas delas, inclusive, sobre o próprio cardeal argentino que, me recordo, havia chamado atenção em uma das milhares de matérias que li sobre o conclave de 2005, no qual ele protagonizou uma disputa com o eleito Ratzinger.

Conclave encerrado, papa eleito, Clayton, Pablo e Cabral de volta ao Brasil, o 13 Horas seguiu a sua vida normal. E eu, nunca mais fui o mesmo profissionalmente. Aquela cobertura me provocou e me deu a certeza daquilo que mais me movimenta: a informação. Foi ali, tentando contar a história da eleição católica, querendo orgulhar aqueles que apostaram em mim no 13, que eu entendi o sentido e a responsabilidade de um cobertura desse tamanho. Foi ali, naqueles mais de trinta dias que entendi que o jornalismo se faz com emoção, com o coração. Que a comunicação é, além de tudo, a ciência mais eficaz de contar a história.

E assim, há dez anos, uma eleição do outro lado do oceano me fez ter a certeza da minha paixão: o jornalismo. Vida longa ao Papa Francisco e toda sua capacidade humana de levar a solidariedade e a compaixão com a sua liderança.

*Jornalista