O DESASTRE ARGENTINO
Paulo Gastal Neto*
A Argentina, desde há muito tempo, foi uma referência para a economia brasileira e o Brasil para eles. Uma espécie de espelho. Quem não recorda da expressão ‘efeito orloff’, para ilustrar o que aconteceria aqui ou lá, diante de uma crise ou época de bonança? O que era vivido por lá seria vivido aqui e vice-versa? A peça publicitária, dos anos 80, era de uma propaganda da Vodka Orloff, onde o protagonista conversava com ele mesmo, dizendo que ao beber a tal marca, não teria ressaca. O comercial que marcou época e virou bordão nacional, também serviu de referência aos economistas. O Brasil é o amanhã da Argentina e ela é o amanhã do Brasil. Então, baseado nesta lembrança histórica, vale a ideia que – diante do caos econômico em que se meteu um dos principais parceiros comerciais e nação amiga do Brasil – a preocupação seja extremamente procedente.
Neste sábado, 08.07, após um festival de desencontros e informações contraditórias, depois de a grande mídia argentina ter anunciado a renúncia do presidente Alberto Fernández, a crise ficou escancarada para o mundo. A renúncia viria a ser desmentida em seguida, mas os mercados já estavam em ebulição e o Peso sofria mais uma desvalorização. O presidente e sua vice estiveram por horas ao telefone, segundo os jornais de Buenos Aires, cometendo um tanto de trapalhadas e fazendo com que os mercados ficassem instáveis e as previsões de inflação atingisse o surpreendente patamar de 80 % ao ano. A crise argentina já está sendo comparada a da Venezuela. O peronismo ruiu. Ele está na contramão da história. O governo de Alberto Fernández é um desgoverno, disse uma fonte próxima ao próprio presidente à uma jornalista portenha.
Todas as fontes do governo argentino, que servem de referência aos grandes periódicos, dizem abertamente que Alberto “se foi”, “está isolado”, “que vive uma realidade paralela”. Escândalos se sucedem e Cristina Kirchner já está de olho na cadeira presidencial. Na semana passada ela deixou vazar aos argentinos: “Olha, eu consigo mostrar meus ‘chats’ mas tem gente que não consegue”. Suas palavras públicas referiam-se a conversas privadas em relação a conturbada vida íntima do presidente, que o impede de fazer o mesmo. Cristina faz o tipo: com um vice desses não necessito de inimigos.
Ao mesmo tempo que Cristina luta contra a história tentando não envolver-se na conjuntura, apenas buscando uma brecha para então assumir o lugar de seu ex-amigo, o custo dessa parafernália irresponsável é um Peso desabando a cada dia frente ao Dólar, miséria nas ruas de Buenos Aires, insatisfação do mercado financeiro e dos bancos, indústria perdendo postos de trabalho e o povo argentino definhando economicamente.
O que deverá acontecer diante de uma possível renúncia de Fernández é que uma Argentina – ao invés de transferir o poder para o kirchnerismo – acabar entrando numa convulsão social. Kirchner, irresponsavelmente acredita, que os argentinos são ingênuos e podem então lhe delegar a presidência, pensando que ela não seja parte da crise.
A Argentina infelizmente se transformou num país sem controle, mesmo que a porta-voz da Casa Rosada, Gabriela Cerruti, tenha dito aos quatro cantos, na sexta-feira que: “El presidente está en control del país”. Porém, ela esqueceu de dizer que: “não está sabendo que cada dia controla menos. Pobres “hermanos”! Mas fica a lembrança: “eu sou você amanhã”!
*Radialista e editor do www.pelotas13horas.com.br