MASSACRE: A VISÃO PELO ÂNGULO DA VÍTIMA
Neiff Satte Alam*
Um terrível cheiro de óleo diesel e uma forte movimentação no ambiente deixaram-os quase sem poder respirar. Abraçaram-se, entrelaçaram-se, ainda jovens, seus olhos projetados sobre concavidades não podiam ver muito do que estava ocorrendo.
Um ruído ensurdecedor, como o de centenas de patrolas raspando o piso em que se encontravam, fazia com que seus membros frágeis ainda tremessem de medo, era uma morte anunciada. Luzes, vindas não se sabe de onde, atraíram aqueles jovens em pânico pela incerteza de seu destino.
Entreolharam-se, mudos e perdidos e se lembraram de histórias contadas por sobreviventes antepassados seus e, nestas histórias, estes acontecimentos eram relatados de forma idêntica e muitos parentes haviam morrido ainda jovens e não puderam deixar descendentes que garantiriam a sobrevivência da própria espécie.
Correndo, saltando freneticamente, amigos e vizinhos tentavam fugir daquele ataque bárbaro de um inimigo muito poderoso e totalmente indiferente aos anseios daqueles seres perdidos pela sua inferioridade absoluta frente a um opositor altamente qualificado e determinado a capturar a todos, indistintamente.
Encontraram, estes jovens, algumas pedras que, embora sujas e mal cheirosas, serviram de abrigo até passar aquele temporal de insanidade e oportunismo dos agressores. Seus membros estavam quase paralisados pelo cansaço e pelo medo, seus músculos já não tinham mais forças e ali ficaram por algum tempo.
Acima de suas cabeças verificaram que os agressores tinham encontrado opositores mais qualificados e estavam devolvendo os seus amigos capturados, a maioria mortos e besuntados de óleo, ao seu local de captura. O ambiente era de absoluto pavor. Indignados, tristes e desolados saíram em busca de locais mais calmos e quem sabe livre daqueles caçadores tão bem armados.
Já ao amanhecer, distantes daquele quadro apocalíptico, um camarão disse para o outro ainda em estado de choque: “- Pois bem, este nosso inimigo é tão inconsequente que não percebeu que a nossa sobrevivência está intimamente ligada a deles, assim como a dos demais seres vivos. Pior ainda, nossa extinção será como uma “bola de neve” que chegará por atingir toda a sua pretensiosa espécie que pensa não fazer parte do grande concerto em harmonia que é o Planeta Terra, casa de todos nós…
Não deveriam ser os ambientalistas, os policiais os responsáveis por defenderem o frágil equilíbrio de nossos ecossistemas, mas o bom senso e a inteligência dos que dependem deste mesmo meio de sobrevivência. Pela inconsequência e ignorância estão matando o futuro, não apenas dos pequenos camarões, mas de seus próprios filhos.
*Biólogo, Professor de Biologia e Especialista em Informática na Educação. Participa do Treze Horas desde a sua criação, em 1978.