A exclusão mora nas calçadas
Pedro E. Almeida da Silva*
Estima-se que mais de 150 milhões de pessoas em todo o mundo vivem nas ruas, representando cerca de 2% da população global. No Brasil, aproximadamente 280 mil pessoas enfrentam essa realidade, o que equivale a 0,13% da população nacional, concentradas principalmente nas grandes cidades. No Rio Grande do Sul, esse número ultrapassa 10 mil pessoas, correspondendo a 0,1% da população, enquanto em Porto Alegre, cerca de 3 mil pessoas estão em situação de rua. Em Pelotas, em torno de 750 pessoas estão vivendo nestas condições, com um índice de 0,22% da população, similar a capital, e o dobro da taxa observada no estado.
As causas deste cenário são diversas: ineficácia das políticas redistributivas de renda; acesso limitado à moradia; ocupação urbana excludente, transporte público precário e falta de oportunidades ou qualificação profissional são alguns dos fatores que favorecem esta situação. Atualmente, cerca de 62% das pessoas em situação de rua no Brasil não têm qualquer fonte de renda fixa, enquanto 39% relatam viver exclusivamente de esmolas ou reciclagem. Além disso, 35% dessa população sofre com transtornos mentais e mais de 45% têm histórico de dependência química, problemas agravados pela insuficiência de programas de tratamento e acolhimento.
Programas como o Sistema Único de Assistência Social (SUAS) e o Consultório na Rua têm buscado ampliar o atendimento integral dessa população. Em 2023, o SUAS contabilizou cerca de 55 mil atendimentos em Centros de Referência Especializados para Pessoas em Situação de Rua, enquanto o Consultório na Rua está presente em aproximadamente 170 municípios brasileiros, atendendo 30 mil pessoas anualmente, o que está muito aquém dos prováveis mais de dois mil municípios com mais de 100 pessoas nesta situação. Além da inclusão limitada, ainda existem desafios estruturais e culturais, incluindo a resistência dessa população em aderir às políticas públicas, reflexo das limitações das estratégias disponíveis.
As soluções devem ser desenhadas e implementadas no âmbito municipal, onde as pessoas vivem e as parcerias público-privadas locais podem ser uma ferramenta essencial para desenvolver projetos sustentáveis e estratégicos, especialmente quanto à empregabilidade. Atualmente, cerca de 12% dos programas voltados para a inclusão produtiva no Brasil já contam com parcerias desse tipo, mas a abrangência precisa ser urgentemente ampliada.
Deixar essas pessoas à mercê de esmolas, dormindo ao relento e realizando necessidades primárias na via pública é uma inaceitável passividade que reduz a qualidade de vida de toda a população. Esse descaso reforça a exclusão social, agravando o problema e tornando as soluções mais distantes e difíceis.
*Professor Titular da Universidade Federal do Rio Grande – FURG -pedrefurg@gmail.com