
O ‘Memória do Treze Horas’ relembra hoje um dos fatos mais marcantes na história do programa: a entrevista de Tancredo Neves ao debate Treze Horas, com a participação do então Deputado Federal Irajá Andara Rodrigues. Os dois conviveram intimamente em Brasília e o relado de Clayton Rocha, no ‘Memória do Treze’ de hoje, relembra o fato com detalhes.
IRAJÁ ANDARA RODRIGUES E TANCREDO NEVES
Por Clayton Rocha
O presidente da poderosa Comissão de Orçamento e Finanças da Câmara dos Deputados estava em estado de graça: um amigo dele recusara dezenas de convites de Brasília, SP, Belo Horizonte e Rio de Janeiro para almoçar na casa de Irajá Andara Rodrigues, ex-prefeito de Pelotas e deputado federal pelo Rio Grande do Sul. O visitante tinha títulos de sobra para ostentar, se quisesse: ministro da Justiça de Getúlio Vargas, Primeiro-Ministro do gabinete parlamentarista de João Belchior Marques Goulart, e por último Governador de Minas Gerais. Mas título mesmo, diferenciado e por tantas vezes sonhado, era o de agora: presidente da República! Assim foi recebido por Daisy e Irajá Andara Rodrigues. – “ Estou aqui em busca de conselhos, e em sinal de homenagem pessoal aos seus vastos conhecimentos das questões orçamentárias e financeiras do nosso país”, disse-lhe Tancredo de Almeida Neves.

Almoçaram, interromperam o almoço para que o presidente eleito falasse ao debate 13 Horas de Pelotas, voltaram à mesa e depois, entre cafés e xícaras de chá, trataram de questões orçamentárias na parte da tarde. Irajá, profundo conhecedor da matéria, além de muito respeitado nacionalmente, prestou relevantes serviços ao presidente. O ex- Prefeito de Pelotas, que foi vulto chave na criação do Banco Meridional do Brasil, tinha tamanha força política em Brasília que acabou sendo dele a indicação do novo presidente do banco, o ex-deputado federal e ex- Governador do Rio Grande do Sul Sinval Guazzelli. Tancredo, íntimo de Guazzelli e de Irajá, sabia escolher os seus conselheiros diferenciados. Era um homem dos detalhes e das minúcias, alguém que aprofundava a conversa até ser convencido por inteiro das teses de seus amigos e colaboradores. Assim ele governou Minas Gerais, assim ele acabara de conquistar a presidência da República.
O poder, depois de conquistado, escraviza quem o exerce. E depende da palavra, dizia Tancredo, esse exercício diário sem o qual não se chegará jamais a lugar nenhum. O presidente dizia que fazer política é o mesmo que olhar para o céu:- É preciso estar sempre muito atento pois o movimento das nuvens é enganador, nunca se sabe onde elas se encontram. Aquele que hesitar diante das tomadas de decisão fracassará. Ele catalogava os homens das horas chaves, e precisava deles, pois sem eles seria impossível governar. E tinha predileção por políticos do Rio Grande do Sul. Chegou a dividir apartamento no Rio de Janeiro com o deputado federal Vítor Issler e com o genro de Issler, o empresário pelotense Genuíno Ferreira.

Tancredo de Almeida Neves, um mineiro encantado pelo Rio Grande de Vargas, de João Goulart e de Oswaldo Aranha, sabia que o poder dependia dos altos talentos e da tenacidade dos gaúchos. Quando discursou nas despedidas em São Borja, sabia o que estava fazendo. Vargas saboreava o poder, degustava essa conquista e se fortalecia no “ interior” do Rio Grande, onde estavam homens de têmpera, levados até ali pelo tamanho dos seus sonhos e dispostos a suportar a dureza necessária diante de um projeto de governo de dimensões nacionais.