SINTO-ME NO BANCO DOS RÉUS!
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Clayton Rocha*
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Sinto-me assim o tempo todo: – no banco dos réus! Por ter testemunhado, em inúmeras esferas de poder, e sem nenhuma tomada de posição, essas velhas conversas superficiais e “fiadas” de tantos quantos, “ilusionistas” da política partidária, assassinaram as esperanças e as inocências de todos nós.
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Toda vez que observo cenas públicas de miséria junto aos “latões de lixo”, para ficar tão somente na crueldade desse exemplo; ou quando vejo as pessoas jogadas ao relento, onde recebem tão somente a solidariedade de seus cães de estimação, meu desencanto alcança níveis insuportáveis de indignação, impotência e repulsa. E então penso: – É inaceitável o exercício do poder apenas pelo prazer do poder. É intolerável o bônus em lugar do ônus! É revoltante testemunhar-se uma “gargalhada política” fácil e teatral, ou os múltiplos sinais de arrogância e de soberba diante da multiplicidade de dramas populares.
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Convencido de que a dignidade política passa pela seriedade fisionômica (bem assim!) e pelo silêncio necessário diante das imagens fortes da dor alheia, em cenários que inviabilizam qualquer tipo que seja de comemoração, deixo-me envolver pelo desânimo e pela descrença quando os eleitos exageram durante as festivas comemorações em seus “mundos diferenciados”. E então, por não poder fazer nada, absolutamente nada contra essas forças poderosas de plantão, sinto-me – a cada dia que passa – no banco dos réus; aqui nesse local de silenciosas e torturantes perguntas.
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Adianta termos olhos se eles são incapazes de enxergar? De que vale a voz se ela se deixa envolver pelo medo e pelo silêncio? De que adianta o coração se ele acaba sendo esquecido dentro do freezer? E o que representam as nossas pernas, se elas se habituaram a fazer caminhadas que saem do nada rumo a lugar nenhum? A propósito, caro leitor: – o senhor também não se sente desagradavelmente sentado no banco dos réus, dos omissos e dos inúteis diante da comunidade?
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Falando agora sem rodeios, e talvez para aliviar a minha própria consciência, confesso que sinto-me culpado pela minha omissão, pelo silêncio político da minha voz, por ter recebido esse dom de Deus que me ajudou tanto a improvisar, a me indignar e a conduzir debates.
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A ideia de que carreiristas cuidam exclusivamente de seus interesses e de seus umbigos, sendo incapazes de sentir as dores alheias, me desencanta profundamente e retira da minha mente qualquer esperança quanto a ações políticas e administrativas permanentes, envolventes e contagiantes!
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A hipocrisia política brasileira destes nossos tempos é abominável! Toda a frieza teatralizada é simplesmente repulsiva! Esse andar de cima, endereço de festividades nababescas e de salários e “penduricalhos” inimagináveis, humilha e desencanta todo aquele que sobrevive de um constrangedor salário mínimo!
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A gratidão eleitoral da classe política, salvo raríssimas exceções, não passa de um show de horrores e de desprezo aos que sobrevivem na dificuldade, sempre escondidos pela própria vida no endereço daquela formiga da lenda: – Formiga preta sobre uma pedra negra e numa noite escura! (Só Deus sabe que ela existe).
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Finalizando, aqui desse meu banco dos réus – o endereço permanente dos “omissos” da minha espécie – eu e tantos outros – valho-me de um raciocínio cruel proferido lá atrás no tempo pelo presidente Abraham Lincoln, segundo o qual a “mentira política” costuma prosperar em todos os endereços de absoluta subserviência (e que jamais foram visitados pela educação) tripudiando sobre a docilidade e “inocência” das ovelhas, presas fáceis para esses lobos que as atacam mortalmente, sejam elas as ovelhas dos campos, dos espaços urbanos ou dos presépios. (CR).
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*Jornalista e coordenador do Treze Horas há 46 anos.