ARTIGO – O LEÃO DO CARLINHOS ANDRETTI

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O LEÃO DO CARLINHOS ANDRETTI 

Por Clayton Rocha

O Leão gostava de passear de carro. A Avenida Bento Gonçalves era um grande endereço da juventude e o Carlinhos se deliciava com a vida. Durante os desfiles, na lenta, eu de motorista, o leão do Carlinhos era a sensação do pedaço. Mas foi ao lado do restaurante do Élvio Bório, na Associação Rural de Pelotas, que o seu leão de estimação saiu do sério.

O grupo de amigos que jantava calmamente foi avisado da grande confusão: enfurecido com a presença de alguns cães junto à camioneta Fiat onde ele ressonava, o leão do Carlinhos a destruiu em pedaços, deixando-a emborcada com as quatro rodas para cima. Durante mais de três horas juntamos os cacos do estrago todo, até que o leão fosse totalmente dominado. – “Guris, vocês até me desculpem, mas ele sempre foi tão dócil e bonzinho”.

Vamos tratar de voltar ao restaurante e pedir novos pratos, pois a despesa será toda minha. Assim era Carlinhos Andretti, o dono do belo casarão da Antônio dos Anjos esquina General Osório, endereço este visitado na melancólica e chuvosa tarde desta quarta-feira, 9 de Setembro de 2020, por uma retroescavadeira insensível e completamente indiferente à memória de uma cidade Bicentenária. Este dia ficará guardado em nossa memória como a tarde dos escombros, valorizados pelos preciosos pedaços de mármore de Carrara ali acumulados nas sobras de um belo casarão de décadas e décadas vencidas.

Para sorte nossa – e sempre há uma luz no fim do túnel – o Caixeiral não transformou-se em garagem central, um Banco do Brasil antigo sobrevive até mesmo aos cupins, mesmo caindo aos pedaços; o 7 de Abril sobreviverá à toda sorte de desafios; o Clube Comercial teve mais sorte do que juízo; a estação ferroviária foi restaurada mesmo tendo perdido o charme dos tempos da Maria Fumaça e de seus vagões de passageiros; o Grande Hotel continua lá, mesmo sem saber o que quer; o Casarão 8 virou um belíssimo Museu do Doce sem público e dezenas de prédios outros ainda vivem – ao menos – na nossa memória e nos mais ardentes sonhos de uma digna e necessária restauração. Ainda não nos abandonamos de vez! Vale tentar, e mesmo que seja na insistência, sair em busca de sinais de glória da Cidade das nossas vidas. (CR).